21 de julho de 2016

Mientras tanto

Quando a porta do ônibus se abre, somos recebidos pelo cheiro de manteiga rançosa ou óleo velho de fritura. Misturado ao forte calor das três da tarde, esse odor provoca náuseas e está encrustado nas paredes, no chão, no cão vira-lata alimentado por um funcionário do bar.

O cachorro parece concordar comigo, já que dispensa o pedaço de salgado frito, deixando o quitute para os pombos que mais parecem galos de briga.

A minha viagem ainda não terminou e o próximo ônibus só parte daqui a uma hora. Sentada no único banco vazio – justamente o que não está protegido pela sombra, claro – me distraio ouvindo a rádio.

Autoescola Santa Tereza D’Ávila. Nos dias de hoje é cada vez mais importante ter uma habilitação para dirigir; seja para o trabalho, seja para o lazer.

Nos dias de hoje.

Da rodoviária, nem se pode dizer que parou no tempo. Muita coisa é igual, porém tudo está mais degradado. Provavelmente porque são os mesmos bancos, chão, guichês, lanchonetes de trinta, sessenta, cem (?) anos atrás.

Pergunto a um funcionário se há tomadas onde possa carregar o celular: Ali, do outro lado, aproveita que ainda tem.

(Porque o bebedouro, as lixeiras, a coleta de lixo, a limpeza, a tinta das paredes, tudo isso já foi arrancado)- é o parênteses que intuo na gargalhada debochada do homem.

Na “sala de TV”, onde supostamente haveria uma tomada, algumas pessoas esperam sentadas em cadeiras velhas; um balde recebe a goteira do teto; uma televisão de tubo transmite chuvisco. Há um pequeno altar com a imagem de uma santa, provavelmente Nossa Senhora da Glória, a padroeira da cidade.

Encontro finalmente uma fonte de energia na lojinha de cacarecos, que vasculho com atenção, tentando achar algo comprável para retribuir a gentileza da dona. Há adesivos de princesas da Disney, imagens de santos, presilhas de cabelo, brinquedos de plástico e uma infinidade de produtos que meus olhos de cidade grande julgam cafonas e vagabundos. 

Numa caixa de sapatos, alguns DVDs estão à venda, não em embalagens plásticas próprias, mas em saquinhos transparentes, com suas capas reproduzidas em papel ofício. O primeiro da fila exibe um ator que desconheço e é dirigido por alguém que ignoro. Seu subtítulo parece muito adequado ao cenário: The smallest towns hide the darkest secrets.



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